Projeto de primeiro mundo para crianças carentes. Vai pegar?...


Há vinte anos estamos andando em círculos: é uma trabalheira para reintegrar alunos expulsos da escola, garantir a vaga para os que são obrigados a pagar transporte porque a escola próxima de casa seleciona os alunos, pedir o afastamento de diretores e professores autoritários e/ou relapsos, quando não criminosos, etc. etc. Parece pouco, não é?

Mas é tanto trabalho que nunca conseguimos focar no âmago da questão, ou seja, a qualidade do ensino! Chegamos à conclusão de que a política educacional brasileira não vai mudar, ou seja, o tráfico de vagas não vai diminuir, os alunos vão continuar sendo expulsos, a aula vaga vai comer solta, diretores e professores autoritários e incompetentes permanecerão reinando na rede pública, porque... enquanto houver problemas tão graves, a qualidade do ensino vai ficar em segundo plano. E assim o apartheid disfarçado em que vive nossa sociedade vai continuar ad aeternum.

Trocando idéias com a amiga Cremilda, chegamos à conclusão de que os governos federal, estadual e municipal desejam, em termos de educação, que nós batamos as botas, rsrs. Sim! No dia em que não estivermos mais aqui, quem é que vai pentelhar com essas questões? Somos uma geração de indignados que está acabando...

O que mais preocupa é que existem escolas democráticas e eficientes no Brasil, mas elas são ignoradas, a não ser as que visam a exclusão ou a elitização dos alunos. Veja por exemplo o endeusamento que a mídia está fazendo da escola Lúcia de Castro Bueno, uma daquelas que selecionam seus alunos.

Hoje vou falar de um projeto que, se der certo, poderá acabar com a educação carcomida que assola todo o país, acabar com a incompetência e a má vontade que resultam no analfabetismo funcional das novas gerações. Um projeto educacional que aliás já deu certo, mas lá em Natal, bem longe dos interesses da "inteligência" brasileira, concentrada no eixo São Paulo/Rio/Minas. Por isso a repercussão por aqui é pequena, tão pequena quanto as mentes e as boas intenções de quem manda na educação dos maiores estados brasileiros.

Por ironia, o autor desse projeto é um neurocientista paulistano, considerado um dos dez mais importantes em todo o mundo, inclusive indicado ao Prêmio Nobel. Já foi capa do NY Times, do Washington Post e das maiores revistas de ciência do mundo. Aqui, em terra tupiniquim, ele é mais conhecido como filho da escritora de livros infanto-juvenis Giselda Nicolelis...

O desafio de Miguel Nicolelis, que como a maioria dos grandes cérebros construiu seu trabalho de pesquisa fora do Brasil, foi não apenas criar um centro educacional voltado para a ciência, mas fazê-lo numa área extremamente carente, com o IDH (índice de desenvolvimento humano) dos mais baixos do país. Com isso, ele quis e conseguiu mostrar que crianças mal nutridas e de famílias sem instrução podem desenvolver o mesmo potencial ou até superar as habilidades e competências de alunos das melhores escolas particulares.

Assim, em 2007, nasceu a escola de Educação Científica Alfredo J. Monteverde (entre no link, ela é real!), em Natal e Macaíba, RN, concentrando nas duas unidades mais de mil alunos. Trata-se de uma escola complementar à de ensino fundamental ou médio, ou seja, os alunos estudam um período na escola regular e outro na de educação científica. Vi um vídeo sobre a escola na TV e não acreditei na expressão concentrada dos alunos, às voltas com aparelhos e instrumentos de laboratório, como telescópios, motores e mil engenhocas.

A escola faz parte do Instituto Internacional de Neurociências de Natal, dirigido por Miguel Nicolelis, que recebe verbas de instituições privadas do mundo inteiro. O Instituto tem outros projetos de cunho social, como um centro de saúde voltado à gravidez de alto risco, e parte do princípio de que a ciência pode ser um agente de transformação social.

Leia aqui a entrevista de Miguel Nicolelis para a revista Caros Amigos e vai entender porque esse projeto, que causa inveja aos próprios Estados Unidos - onde não existe nada parecido - é e continuará sendo ignorado pela mídia e pelas autoridades estaduais brasileiras. O Governo Federal deu apoio inicial ao projeto, mas o objetivo do Instituto é espalhar novas unidades de escolas de Educação Científica até atingir um milhão de crianças brasileiras. Isso só será possível se as grandes fortunas brasileiras, além dos governos estaduais e municipais, tiverem INTERESSE em investir no projeto. Do jeito que as coisas andam por aqui, o interesse será elitizar essas escolas, caso elas cheguem às nossas metrópolis... Qual o seu palpite?

Ah: esqueci de dizer que em lugar deste texto eu ia falar de uma resposta absolutamente ridícula que o EducaFórum recebeu da SEE sobre um assunto que já vinha do ano passado... Mas pra que falar de abobrinhas, rsrs?

Comentários