PC antipedagógico


São tantas as falhas do ensino público no Brasil que a gente não se surpreende com mais nada. O pior de tudo é prever os desmandos e não poder fazer nada para evitá-los.

Quando o prefeito Paulo Maluf começou a "informatizar" as escolas, rios de dinheiro público foram desviados para a compra de milhares de computadores que até hoje, dez anos depois, só servem de enfeite. De lá para cá, a "informatização do ensino" passou a ser considerada importante e praticamente todos os governos municipais e estaduais do país foram adquirindo e "enfiando" computadores nas escolas. No entanto, a maioria das unidades deixa os aparelhos encostados em lugares inadequados para o uso e aquelas onde os computadores estão devidamente instalados não sabem o que fazer com eles. Os professores não são treinados e não existe projeto interdisciplinar para utilizar a informática com fins pedagógicos. Seria ingenuidade acreditar que uma escola onde nem mesmo a biblioteca é utilizada como ferramenta para o ensino saiba aproveitar os recursos da informática. 90% das escolas públicas brasileiras tem a biblioteca fechada por falta de funcionários ou de projeto. 38% das escolas possuem computadores, mas, e daí?...

Segundo o site Aprendiz, uma pesquisa do Ministério da Educação (MEC) indica que o aparecimento de novos laboratórios de informática nas escolas brasileiras fez o ensino piorar. Segundo a pesquisa, estudantes que usam computadores na escola estão seis meses atrasados nas matérias curriculares em relação aos alunos sem acesso ao equipamento. A especialista Fabiana de Felício, autora do estudo, analisa: "Sem a supervisão dos professores, as crianças perdem tempo em frente ao computador com atividades sem nenhuma relevância para o ensino". Leia-se: jogos e bate-papos virtuais.

Outros países têm uma lição elementar a ensinar ao Brasil. Tais projetos só foram adiante com sucesso porque os professores receberam treinamento para fazer uso dos PCs para fins pedagógicos. No Chile, é o caso de 80% dos docentes. No Canadá, as escolas contratam ainda especialistas encarregados de organizar bibliotecas de softwares e orientar os professores sobre como aplicá-los em sala de aula.

"Aqui os professores mal sabem ligar o computador", resume Roseli Lopes, coordenadora do Núcleo de Sistemas Integrados da Universidade de São Paulo (USP). Ela é uma das responsáveis pela implantação do programa do governo federal cujo objetivo é distribuir laptops aos 30 milhões de estudantes da rede pública.
Numa visita à escola municipal Ernani Silva Bruno, de São Paulo, uma das cinco no país que servem de piloto ao projeto, as dificuldades ficam às claras. Enquanto uma professora quer saber como acionar a letra maiúscula no teclado do laptop, a aluna Giovana Gomes, de 11 anos, expressa sua ambição em relação à nova máquina: "Vou poder brincar no site da Barbie e jogar games na escola". É nisso que serão aplicados rios de dinheiro destinados ao ensino público? Alguém fiscaliza?...

Prezados leitores do blog, estarei fora de São Paulo até o dia 20, sem acesso à Internet. Um abraço a todos e até lá!

Comentários

Leandro disse…
Sou da opinião de que, por trás desse papo de "inclusão digital", há, na verdade, um projeto eleitoreiro barato e mais uma forma de de proporcionar lucros extras aos amiguinhos...
Caso interess, eu havia feito um pequeno comentário sobre isso aqui:
http://maiscontradicoes.blogspot.com/2006/04/incluso-digital.html#comments
Abraço
Ricardo Rayol disse…
E viva o maravilhoso mundo da tecnologia pública. Um bom descanso.
Luisete disse…
Giulia,
Certeira, aliás como sempre, a sua avaliação. Meus filhos, hoje adultos, tiveram acesso ao computador na adolescência e eu sempre fiscalizei. Os jovens perdem um tempo precioso no Orkut, baixam múscas, brincam e muitas vezes sequer têm curiosidade de buscar o mar de conecimentos interessantes que têm à disposição. O acesso precisa ser limitado e conduzido por professores experientes, senão será um desastre, servirá apenas para abrir as portas ao universo da deliquência, das drogas, da prostituição infantil, da pornografia ... Esse é, realmente, um assunto de muita gravidade.
Parabéns pela sua abordagem!
ADOREI o seu texto, ontem mesmo escrevi um parecido que será postado em breve. Segndo alguns professores amigos meus. alguns alunos fazem as pesquisas para trabalhos escolares na base do CTRL C CTRL V. Em muitos casos ao invés de ajudar no desenvolvimento escolar, atrapalha. Porém não podemos ser radicais, a inclusão digital ajuda sim, qdo usada corretamente!
Anônimo disse…
Enquanto leigo sempre observei com muito ceticismo notícias relacionadas à informatização no ensino público. Isto porque, até onde sei, não existe sequer uma política que dignifique o professorado que tem baixíssima remuneração, sinal claro de pura falta de rconhecimento. Há de se investir antes no(a) educador(a) para que depois pensemos em equipa-lo(a) com tais recursos.
Cadinho RoCo